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A Fundação Macy e a Saúde Mental no Mundo

Considere ler essa conversa entre Bateson e Margaret Mead. :)

Margaret Mead: (...) I think the difference between art and science is that each artistic event is unique, whereas in science sooner or later once you get some kind of theory going somebody or other will make the same discovery.

Personagens principais deste capítulo:
1. Fremont-Smith, Abramson
2. Fremont-Smith, Mead

O capítulo 7 "The Macy Foundation and Worldwide Mental Health" passeia entre os anos 1930 a 1960 e seus investimentos e personagens que permeavam o campo da saúde mental. Ou, melhor, da mente, em geral.

Para começar a história, Heims refere-se à fundação da Macy Foundation, datada de 1930, promovida por sua filha Kate Macy Ladd, após um estudo sobre as áreas de pesquisa negligenciadas pelas fundações filantrópicas. O estudo recomenda que os cuidados com a saúde devem ser a preocupação central da fundação. "The study found that 'biochemical and physiological research were receiving far more attention than the psychobiological and sociologica,' and what had been specially neglected was 'the search for new methods and ideas... or operational concepts" (p. 164).

A fundação, então, em 1936, é orientada a uma filosofia de abordagem organismica e de conceitos operacionais, como a homeostase. A fundação deu suporte/apoio particular a investigações do campo transdisciplinar que veio a se tornar a medicina psicossomática. 1936 também é o ano em que Frank Fremont-Smith passa a participar da fundação.

Na sua entrada na fundação, Frank Fremont-Smith, sob a tutela de Lawrence K. Frank, criou o campo da medicina psicossomática (p. 166), os dois ajudaram a começar uma revista profissional do campo (Medicina Psicossomática de 1939) e uma sociedade, 5 anos depois (a revista se tornou orgão oficinal da sociedade).

Fremont-Smith era quem decidia para onde iriam os fundos de financiamento de pesquisa e já estava profissional em organizar conferẽncias, de maneira que passou a ser "Sr. Conferências Interdisciplinares". Para se ter uma ideia, Fremont-Smith organizou 350 encontros interdisciplinares nos 35 anos posteriores à II Guerra Mundial.

Foi também através da Fundação Macy que alguns estudos sobre o LSD foram realizados. De maneira controversa, eles também tiveram o apoio da CIA. Harold Abramson sobre Fremont-Smith
"A multi-disciplinary project was accordingly set up. Without Dr. Fremont-Smith's insight into multidisciplinary problems involving mentation and chemistry, I don't think the project could have developed as it did." (p. 167)

É claro que esses investimentos em saúde mental, em especial, em estudos sobre interferências de drogas em mentes, não poderia sair imune à problemas relativos às guerras. O próprio Abramson esteve envolvido em um caso grave de morte de um cientista (1953) dias depois de ter ingerido LSD, sob a tutela da CIA.
"The CIA was specially interested in the hallucinogen LSD, and Abramson was deeply involved in promoting LSD research on their beahlf and reporting the latest findings back to the intelligence agency. One among quite a few instances that came to light twenty years later concerns a man whose drnik had been secretly spiked with LSD by a researcher seeking to observe behavioral effects. The subject, Dr. Frank Olson, became very disoriented, was sent to Abramson, who posed as psychiatrist, and subsequently leaped to his death out of a hotel room window. An elaborate cover-up was invented to hide the facts from Olson's family." (p. 167)

A morte de Olson foi tema de muitos textos e alguns filmes documentários sobre a exploração do uso do LSD. O próprio corpo de Olson foi exumado, posteriormente, a pedido de sua família - havendo duas conclusão de diferentes investigações: 1. que ele teria sido assassinados; 2. que a morte foi acidental/suicídio. Na investigação que determina que ele foi assassinado, seu filho, que a época era uma criança, afirma que ele estava tentando sair da CIA, mas que sua morte fora para evitar sua saída.

Veja os links a seguir:

https://www.theguardian.com/world/2012/nov/29/cia-lawsuit-scientist-1950s-death

http://revistagalileu.globo.com/Revista/Common/0,,ERT135001-17773,00.html

Um caso de uma alucinação coletiva em uma pequena cidade do interior da França, Pont-Saint-Esprit, é, por alguns, atribuída a uma contaminação intencional da CIA, para ver os efeitos coletivos. Albarelli, pesquisador que defende essa tese, atribui que Olson pode ter sido assassinado por estar falando demais, inclusive, sobre a contaminação dessa cidade. Mas, os documentos que supostamente comprovariam sua tese teriam sido destruídos em 1973, como diz a reportagem da Galileu, acima.

Neste período de cooperação com a CIA, Fremont-Smith organizou 3 séries de conferências: Problemas de Consciência - 1950-1964; Neurofarmacologia - 1954-1959; e Uso do LSD em Psicoterapia - 1956-1959, Abramson, envolvido no caso Olson, editou dez volumos para duas das séries de conferências e também assistiu Fremont-Smith, quando este experimentou LSD.
"This use of unknowing subjects in LSD research illustrates how scientists' presumed impulse to truth and psychiatrists' presumed impulse to healing can be manipulated, in this case by the CIA, to a point that violates the most minimal standards of human decency" (p. 168).
Heims entrevistou Fremont-Smith em 1968, na Academia de Religião e Saúde Mental, em Nova Iorque, e teve a impressão de que ele se esforçava para esconder algo - devido a uma sensação de ansiedade que parecia lhe perturbar. Àquela época, os arquivos da Macy Foundation não estavam abertos e pouco se sabia da interação entre a fundação e CIA - ele acredita que essa poderia ser a fonte de sua ansiedade.

"The development of effective communication across the scientific disciplines is perhaps the most urgent need of our era. As Dr. Abraham said, until the nuclear physicists, who through their science have developed the ultimate weapons of hostility, can communicate with the psychoanalysts, who through their science have developed the greatest understanding of the nature and control of hostility - until both these groups of scientists can communicate with, i.e., "make sense to ", those who are responsible for the administration of human affairs, there will be no hope of applying the principles of science and logic to the problems of social behavior and world peace. " (p. 168)

Em 1955, o presidente da Fundação Macy era Willard C. Rappleye, que mudou um pouco a visão, trazendo as ciências sociais para o centro das discussões dos conflitos sociais. No entanto, os trabalho de campo dos antropólogos culturais mostravam que as estruturas variavam de cultura para cultura e, estes, apoiados pela interpretação freudiana, sustentavam que "higiene mental" (saúde da mente?) poderia melhorar os conflitos nessas sociedades - ou até mesmo, eliminar. Esse pensamento, para Heims, era otimista.

Muitos personagens influenciavam essas visões das humanidades. Alguns deles:

- pragmatismo de John Dewey;
- teorias de Freud;
- a antropologia de Boas e Malinowski;
- as ideias da economia Keynesiana (John Maynard Keynes);
- a administração de Franklin Roosevelt; etc.

"The light to psychiatry and anthropology was, however, only rarely focused on the conduct and belief of the social scientists themselves. It is difficult to admit that 'scientific' wisdom is an outgrowth of the biases and visions, ideals and desires of a particular group or profession in a particular culture and that the professionals view is not olympian. This faith in the social sciences was particularly clearly manifested in the formation of the World Federation for Mental health." (p. 170)

Lembremos que a polarização capitalismo versus comunismo, Estados Unidos versus União Soviética, estava a todo vapor. E "to those who feared communist world revolution, world mental health seemed a welcome liberal alternative ideology." (idem).

Uma conferência, apoioada pela UNESCO, em Paris, no verão de 1948, mostrou bem essa polarização, que abrangia as discussões sobre saúde mental igualmente. Dois personagens se destacaram: o americano Harry Stack Sullivan trazia um sentimento anticomunista, esperado pelos E.U.A.. Já Alexander Szalai, trazia um ponto de vista clássico marxista-leninista, colocando a produção como fator central.  Se ambos tivessem pontos de vistas opostos, certamente estariam em maus lençóis em seus países.

Àquele momento, pesquisadores queriam encontrar os problemas e as soluções para os conflitos sociais. Um grupo proeminente era o grupo de Frankfurt, conhecido nas Ciências Sociais, que enfatizavam que os desenhos, necesidades humanos e estruturas de caráter não são as causas principais, já que são contingentes relativas às classes econômicas, condições políticas e formas de governo. Também no encontro da UNESCO, Hokheimer trouxe sua análise das origens do fascimo na Alemanha, ele critica o ponto de vista de Sullivan, pois acredita que dá a impressão de que todos os problemas poderiam ser curados com a psicoterapia, e, na sua opinião, muitos deles estão longe de estar somente no âmbito psico...

"the intrinsic danger of the "psychiatrist's view" lies, I believe, in the encouragement of a manipulative attitude... We get the impression that the anxieties which Sullivan correctly relates to today's international tensions could be effectively cured by psycotherapeutic measures, whereas the main task, in my opinion, consists in the removal of the objective causes for such anxieties, which are far from purely psychogenic in nature." (Hokheimer apud Heims, p. 172)


Foi na primavera de 1943 que Mead, Frank e Fremont-Smith começaram a organizar um grupo formal para representar várias organizações interessadas em psiquiatria e problemas de saúde mental. O resultado foi o Joint Committee on Post War Problems and Opportunities. Em 1945, o grupo decide organizar um encontro internacional em Londres, em 1947, que envolveria 351 grupos preparatórios, destes, mais de 200 dos Estados Unidos, outros de 35 países e composto por mais de 4.000 pessoas. Cada grupo mandaria sugestões para o centro preparatório do encontro, em Londres. A comissão preparatória do encontro lançou um relatório, com autoria de Frank e Mead, que tinha como ideia geral que "a natureza humana, como nós estamos agora descobrindo, é muito mais plástica e flexível do que antes era reconhecida... o desenvolvimento da personalidade deve ser estudado especificamente nos termos de relações interpessoais às quais as crianças são expostas" (tradução minha, p. 173).

"O objetivo da saúde mental foi ampliado da preocupação do desenvolvimento de personalidades mentais saudáveis à tarefa maior de criar uma sociedade saudável" (idem). Neste caso, a sociedade passa a aparecer como paciente (e não apenas o indivíduo). Embora o foco inicial possa ter sido pensar sobre a sociedade, quando a conferência aconteceu, isso foi alterado.

"O lema da organização, a partir da constituição da UNESCO, foi: 'como as guerras nascem na mente dos homens, é na mente dos homens que a defesa da paz devem ser construídas'." (tradução minha, p. 174)

Na Federação Mundial para Saúde Mental, os personagens das ciências humanas tiveram papeis importantes:

  •  Fremont-Smith foi o presidente de 1954-55
  •  Margareth Mead foi a presidenta de 1956-57

Mead foi editoral do texto Cultural Patterns and Technical Change - da Federação + UNESCO - que defendia que introduzir técnicas modernas em países não industrializados poderiam gerar tensões psicológicas e sociais; o livro, portanto, tinha o objetivo de descrever métodos de aliviar essas tensões.

A declaração da WFMH foi enviada anteriorment para McCulloch, que não ficou tão entusiasmado quanto Fremont-Smith. McCulloch não aceitava a ideia de que as hierarquias de valores tinham que ser aplicadas, na teoria da decisão de Savage. MucCulloch, inclusive, foi tão crítico que chamou a declaração da instituição de "manifesto", associando-a ao marxismo.

Trecho da declaração


"Studeis of human development indicate the modifiability of human behaviour throughout life, especially during infancy, childhood and adolescence, by human contacts. Examination of social institutions in many countries shows that these also can be modified. These newly recognised possibilities probide the basis for improving human relations, for releasing constructive human potentialities and ofr modifying social institutions for the common good.

The social sciences and psychiatry also offer a better understanding of the great obstacles to rapid progress in human affairs. Man and his society are closely interdependet. (...)

Thus prejudice, hostility or excessive nationalism may become deeply embedded in the developing personality without awareness on the part of the individual concerned, and often at great human cost.

(...)

Principles of mental health cannot be successfully furthered in any society unless there is progressive acceptance of the concept of world citizenship. World citizenship can be widely extended among all peoples through the applications of the principles of mental health.

The concept of world citizenship implies loayalty to the whole mankind."

Talvez o conceito de "cidadão do mundo", preocupação universal, cuidado, tenha sido o que motivou as críticas de uma visão marxista.

Neste cenário de críticas, os pensamentos sobre o futuro eram dissonantes:

  • McCulloch tinha um otimismo em relação à criação de artefatos, mas pessimismo em relação às direções políticas na sociedade em geral.
  • Stroud tinha uma visão de que o futuro significava uma utilização de alta (high) tecnologia através todas as coisas.
  • Já John von Neumann tinha esperanças em relação às políticas da inovação técnica e, particularmente, nas novas armas tecnológicas.
  • Bateson era otimista em relação a observação de eventos humanos e não-humanos e entendiemtno dos "padrões de conexão", mas era cético em relação aos potenciais benefícios da ação social ou qualquer tipo de manipulação sobre as pessoas.
  • Já Norbert Wiener tinha um compromisso com honestidade intelectual, como Fanon, ele entendia que a intrusão em outras culturas, incluindo as pesquisas antropológicas, não era inofensivas.

Essa variedade de pensamentos sobre o mundo (ref: p. 176-7) tiveram grande poder no estabelecimento do mundo em que vivemos.

A influência da guerra fria, levou à necessidade de organizar uma ideologia alternativa ao marxismo, as grandes visões, o grande número de pariticipantes, a autoconfiança e o otimismo dos cientistas sociais e psiquiatras americanos, tanto quato a disponibilidade do governo em financiar essas organizações eram parte desse processo.

Ainda assim, "the science and technology of cybernetics were seemingly apolitical, neutral, and objective" (p. 178). Inclusive para os cientistas sociais, que buscavam se aproximar, cada vez mais, da "ciência". Ao final, Heims nota que as pessoas cientistas destes grupo, embora houvesse participantes mulheres, estavam interessados na formulação/engajandos de uma ciência "masculina", "dura". Os esforços eram sempre para dar uma forma matemática, para simular uma máquina ou, de outras maneiras, para assemelhar a máquina ao humano. (p. 179).

Resumo do capítulo: The Macy Foundation and Worldwide Mental Health, The Cybernetics Group, Steve J. Heims

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