Valores no Reparo
Lara Houston
Steven J. Jackson
Daniel K. Rosner
Syed Ishtiaque Ahmed
Meg Young
Laewoo Kange
Para continuar falando de reparo, este texto trata de demonstrar quatro exemplos práticos de grupos que trabalham diretamente com reparos de tecnologias, como celulares. A ideia, no entanto, de discutir valores, é enaltecida com o interesse de trabalhar com "the forms and processes of value grounded in the ongoing work of fixing and maintaining the objects and systems around us". Eles estão ligados às infraestruturas que rodeiam as tecnologias e os seres humanos, sendo muitas vezes referenciados como "interação humano-computador".
Essas interações carregam profundas consequências sociais sobre a distribuição de poder, conhecimento e autoridade nas ordens sociais mediadas. Com exemplos que passam pelos Estados Unidos, Bangladesh e Uganda, os autores mostram como os sistemas de valores nas produções industriais e, também, na formação de conhecimento, influenciam na produção de ecologias locais de cuidado e "expertise" - com diferentes noções de relações e autoridade.
Além disso, os exemplos trazidos envolvem condições culturais distintas desde o reparo do objeto quebrado à sua transformação em algo diferente ou, ainda, à substituição de suas peças (ou seja, sem o conserto). Neste sentido, não apenas os objetos são alterados, as noções de cuidado e responsabilidade alteram também as pessoas que se envolvem nessas relações de reparo - elas adquirem novos conhecimentos, novas funções, novos valores, passam de "meros usuários" para algo mais.
Algo que parece ser notável, no desenvolvimento dos autores, é que o colapso está intimamente ligado ao surgimento de novas infraestruturas.
Além disso, me parece que as diferenças de desenvolvimento econômicos dos países adotados interferem diretamente nas relações dos grupos de reparo e da população que busca o reparo. Explico: nos Estados Unidos, um grupo parece estar comprometido com o conserto das coisas, através de uma noção de autoconhecimento e aprendizado e de envolvimento da pessoa que "buscou" o reparo (colocam-a para trabalhar conjuntamente). O segundo grupo do mesmo país - mas não em uma metrópole tão grande quanto NY - é ressaltado por elementos de pré-julgamento: não tem tanto interesse em reutilização, reciclagem ou produção de arte com o produto estragado, por exemplo. Já em Kampala ou Danka o reparo é envolvido por questões de profissionalismo, menos de "ajuda" (ou talvez tenha sido apenas os grupos específicos escolhidos pelos pesquisadores). Nessas duas cidades os valores estão mais ligados ao ganho econômico particular, ao conhecimento "fechado" (sem compartilhamento).
Breakdown, Obsolescence and Reuse:
HCI and the Art of Repair
Steven J. Jackson
Laewoo Kang
Continuando com as problematizações da interação humano-computador, esse artigo entra na discussão aprofundando uma possibilidade além do reparo: a arte e seus mundos possíveis. Ele continua explorando o colapso, a obsolescência e reutilização dos objetos tecnológicos, assim como a criatividade e o desenho de seus artefatos e os agentes humanos que lidam com ele.
O desenvolvimento teórico procura uma abordagem pós-humanista com três possibilidades trabalhadas nas ciências humanas e sociais: a de que humanos não estão sozinhos (mundo de coisas animadas e inanimadas); o de que muito do que nós consideramos como "humano", na verdade, é constituído neste encontro com as "coisas"; que existem interesses autônomos ligados a valores e significados que podem orientar nossa vontade/capacidade de interesse/participação.
Os pesquisadores trabalham com artistas que se envolvem com materiais dispensados, tanto em lixo como em locais de reciclagem ou, como diria na minha terrinha goiana, "pregos". Embora alguns tenham interesse em materiais mais específicos, como um ligado à cultura steampunk e, por isso, procura materiais da metade do século passado, especialmente conectado ao militarismo e guerra fria, outros preferem trabalhar com o que encontram ocasionalmente e deixar sua criatividade fluir.
A fluidez da criatividade parece estar ligada à relação do humano com o objeto: artistas que observam longamente seus objeto esperando uma conexão que os oriente, os perturbe, os faça movimentar na direção da construção de um artefato artístico. Trata-se de um processo de criação extremamente subjetivo.
Os pesquisadores vão além: querem sentir esse processo de criação e decidem fazer sua própria instalação. Reúnem objetos obsoletos ou quebrados que vão ser alinhados na instalação conforme a colaboração de todos os participantes da pesquisa que, na maior parte das vezes, concordam com as intervenções das instalações. O projeto toma forma de maneira colaborativa, com documentação, inventário, desenho (design) e subjetividades.
O processo de transformação de objetos obsoletos ou quebrados em arte parece trazer novos mundos - a possibilidade de mundos possíveis ainda não pensados. Embora o objeto quando concebido tenha uma função, uma vez quebrado ele adquire N funções possíveis - a depender de quem o manipulará. "Moments of reuse and creative repurposing may also call attention to the fundamental incompleteness of human relationships to technology, again with implications for creativity and design".
A criação de novas possibilidades para os objetos quebrados é também uma concepção deste mundo fraturado que vinha sendo explorado por Jackson no texto anterior. É uma possibilidade criatividade numa situação em que tecnologias são enaltecidas como referências ao progresso e à inovação - é uma nova possibilidade de ação no mundo, de construção de novas coisas, de mistura do humano e do objeto capturando forças antigas e fazendo novas combinações.
Lara Houston
Steven J. Jackson
Daniel K. Rosner
Syed Ishtiaque Ahmed
Meg Young
Laewoo Kange
Para continuar falando de reparo, este texto trata de demonstrar quatro exemplos práticos de grupos que trabalham diretamente com reparos de tecnologias, como celulares. A ideia, no entanto, de discutir valores, é enaltecida com o interesse de trabalhar com "the forms and processes of value grounded in the ongoing work of fixing and maintaining the objects and systems around us". Eles estão ligados às infraestruturas que rodeiam as tecnologias e os seres humanos, sendo muitas vezes referenciados como "interação humano-computador".
Essas interações carregam profundas consequências sociais sobre a distribuição de poder, conhecimento e autoridade nas ordens sociais mediadas. Com exemplos que passam pelos Estados Unidos, Bangladesh e Uganda, os autores mostram como os sistemas de valores nas produções industriais e, também, na formação de conhecimento, influenciam na produção de ecologias locais de cuidado e "expertise" - com diferentes noções de relações e autoridade.
Além disso, os exemplos trazidos envolvem condições culturais distintas desde o reparo do objeto quebrado à sua transformação em algo diferente ou, ainda, à substituição de suas peças (ou seja, sem o conserto). Neste sentido, não apenas os objetos são alterados, as noções de cuidado e responsabilidade alteram também as pessoas que se envolvem nessas relações de reparo - elas adquirem novos conhecimentos, novas funções, novos valores, passam de "meros usuários" para algo mais.
Algo que parece ser notável, no desenvolvimento dos autores, é que o colapso está intimamente ligado ao surgimento de novas infraestruturas.
Star and Ruhleder has noted the tendency of functioning infraestructure to disappear, reappering only at moments of breakdown. Susequent work in infraestructure studies and HCI has articulated the significance of tensions and breakdowns as generative, even formative, moments in the emergence of new infraestructural systems and practices.
Além disso, me parece que as diferenças de desenvolvimento econômicos dos países adotados interferem diretamente nas relações dos grupos de reparo e da população que busca o reparo. Explico: nos Estados Unidos, um grupo parece estar comprometido com o conserto das coisas, através de uma noção de autoconhecimento e aprendizado e de envolvimento da pessoa que "buscou" o reparo (colocam-a para trabalhar conjuntamente). O segundo grupo do mesmo país - mas não em uma metrópole tão grande quanto NY - é ressaltado por elementos de pré-julgamento: não tem tanto interesse em reutilização, reciclagem ou produção de arte com o produto estragado, por exemplo. Já em Kampala ou Danka o reparo é envolvido por questões de profissionalismo, menos de "ajuda" (ou talvez tenha sido apenas os grupos específicos escolhidos pelos pesquisadores). Nessas duas cidades os valores estão mais ligados ao ganho econômico particular, ao conhecimento "fechado" (sem compartilhamento).
Breakdown, Obsolescence and Reuse:
HCI and the Art of Repair
Steven J. Jackson
Laewoo Kang
Continuando com as problematizações da interação humano-computador, esse artigo entra na discussão aprofundando uma possibilidade além do reparo: a arte e seus mundos possíveis. Ele continua explorando o colapso, a obsolescência e reutilização dos objetos tecnológicos, assim como a criatividade e o desenho de seus artefatos e os agentes humanos que lidam com ele.
"under this 'pos-humanist' approach and related strains of work in HCI what we've historicaly called the 'human' or 'social' appears not as a pure or separate world of inter-human vlaues and relations operating without the intercession and mediation of things (including technology). Rather, both individually and collectively, to be human is to embedded, constituted and completed in a world of things, as fundamental aspect and building block of our natures. Humans are made human by addition, not subtraction: completed rather than compromised through sustained and care-ful engagements with a world of things."
O desenvolvimento teórico procura uma abordagem pós-humanista com três possibilidades trabalhadas nas ciências humanas e sociais: a de que humanos não estão sozinhos (mundo de coisas animadas e inanimadas); o de que muito do que nós consideramos como "humano", na verdade, é constituído neste encontro com as "coisas"; que existem interesses autônomos ligados a valores e significados que podem orientar nossa vontade/capacidade de interesse/participação.
Os pesquisadores trabalham com artistas que se envolvem com materiais dispensados, tanto em lixo como em locais de reciclagem ou, como diria na minha terrinha goiana, "pregos". Embora alguns tenham interesse em materiais mais específicos, como um ligado à cultura steampunk e, por isso, procura materiais da metade do século passado, especialmente conectado ao militarismo e guerra fria, outros preferem trabalhar com o que encontram ocasionalmente e deixar sua criatividade fluir.
A fluidez da criatividade parece estar ligada à relação do humano com o objeto: artistas que observam longamente seus objeto esperando uma conexão que os oriente, os perturbe, os faça movimentar na direção da construção de um artefato artístico. Trata-se de um processo de criação extremamente subjetivo.
Os pesquisadores vão além: querem sentir esse processo de criação e decidem fazer sua própria instalação. Reúnem objetos obsoletos ou quebrados que vão ser alinhados na instalação conforme a colaboração de todos os participantes da pesquisa que, na maior parte das vezes, concordam com as intervenções das instalações. O projeto toma forma de maneira colaborativa, com documentação, inventário, desenho (design) e subjetividades.
"We witnessed and experienced many of the same pleasures and difficulties described earlier by the artists in our ethnographic study" (...) "Opening up many of these objects looked and felt less like 'opening the black box' in its cold and analytic sense, and more like opening a present, with all the mystery, and more like opening a present, with all the mystery, excitement and pleasure the analogy implies"
O processo de transformação de objetos obsoletos ou quebrados em arte parece trazer novos mundos - a possibilidade de mundos possíveis ainda não pensados. Embora o objeto quando concebido tenha uma função, uma vez quebrado ele adquire N funções possíveis - a depender de quem o manipulará. "Moments of reuse and creative repurposing may also call attention to the fundamental incompleteness of human relationships to technology, again with implications for creativity and design".
A criação de novas possibilidades para os objetos quebrados é também uma concepção deste mundo fraturado que vinha sendo explorado por Jackson no texto anterior. É uma possibilidade criatividade numa situação em que tecnologias são enaltecidas como referências ao progresso e à inovação - é uma nova possibilidade de ação no mundo, de construção de novas coisas, de mistura do humano e do objeto capturando forças antigas e fazendo novas combinações.
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